Nos dias 29 e 30 de outubro de 2021 foi realizado o XIV Encontro Estadual de ONG/AIDS de São Paulo (EEONG).
Convocado pelo Fórum das ONG/Aids do Estado de São Paulo (FOAESP), o XIV EEONG contou com a participação de
XX delegados e delegadas das organizações da sociedade civil afiliadas ao FOAESP, bem como participaram o
Movimento Nacional das Cidadãs Posithivas (MNCP) e da Rede Nacional de Pessoas Vivendo com HIV/Aids no Estado
de São Paulo (RNP+SP).
Em seu temário, o XIV EEONG discutiu a dificuldade de contribuição da sociedade civil organizada para a construção
de políticas públicas em HIV/AIDS, bem como a situação da prevenção, da assistência e dos Direitos Humanos em
relação aos retrocessos e desafios no enfrentamento da epidemia de HIV/AIDS no Estado de São Paulo. Ao final do
encontro, este documento foi aprovado em plenária final.
A extinção de comissões assessoras, como a CNAIDS e a CAMS, além de grupos de trabalho em que a sociedade civil
efetivamente contribuía levando sua expertise adquirida na ponta, dificulta a participação e a construção coletiva
de políticas públicas no âmbito do Departamento de Doenças de Condições Crônicas e Infecções Sexualmente
Transmissíveis (DCCI) do Ministério da Saúde. Neste sentido, é preciso trazer de volta um modelo mais próximo de
discussão para a participação comunitária e contribuição nas políticas de HIV/AIDS.
Para as organizações reunidas no XIV EEONG, o desmonte da política de AIDS é promovido por um governo da
desinformação, que quer desestabilizar a resposta. Assim, o enfraquecimento e o sucateamento do Sistema Único
de Saúde (SUS) tem um caráter político nefasto.
No âmbito estadual, temos mantido o diálogo. No entanto, as constantes mudanças nas gestões municipais têm
enfraquecido os programas locais de enfrentamento à epidemia. No âmbito dos conselhos de saúde, os governos
têm, progressivamente, deixado de ouvi-los. É urgente refortalecer as áreas fundamentais de participação da
sociedade civil com o cumprimento total da Lei 8.142/1990. Entendemos que cabe ao programa estadual de
enfrentamento à epidemia de AIDS a interlocução com as gestões municipais sobre a importância da atuação da
sociedade civil nas respostas locais.
A falta de diálogo torna invisíveis populações mais estigmatizadas, empobrecidas e excluídas. É a sociedade civil que
leva à gestão as necessidades destas populações. Remotamente, por meio da Parada do Orgulho LGBT+ de São
Paulo, a sociedade civil organizada levou à sociedade a discussão sobre a população LGBTQIA+ e a AIDS. No entanto,
nos últimos dois anos, não houve campanhas específicas à população LGBTQIA+, em especial, aos jovens, os mais
vulneráveis à infecção pelo HIV.
A pandemia de covid-19 expôs ainda mais as desigualdades sociais. Mas, também, a falta de diálogo da gestão na
construção de editais, minimizando respostas bem-sucedidas de enfrentamento à epidemia de HIV/AIDS.
Para a eliminação da epidemia de AIDS, é preciso que as metas estabelecidas internacionalmente sejam adaptadas
à realidade brasileira. Neste sentido, é imprescindível que um espaço de diálogo sobre o tratamento clínico das
pessoas vivendo com HIV ou AIDS sejam considerados. É necessário que o conceito de relação institucional seja
restabelecido, visando um diálogo baseado no campo dos direitos e do controle social.
Consideramos a terceirização do SUS perigosa, uma vez que dificulta a intersetorialidade, torna precárias as metas
locais e exclui ainda mais populações que historicamente têm dificuldade de acesso à saúde. O racismo institucional,
a falta de humanização nos serviços de saúde terceirizados e a dificuldade de acesso à saúde devem ser eliminados
da saúde pública e a terceirização não é o caminho.
A terceirização impede a participação da sociedade civil nas decisões sobre as políticas públicas e no gerenciamento
das organizações sociais. Não há legislação que obrigue a instituição de um conselho gestor. Quando um serviço é
terceirizado, quem estabelece as metas? Quais os instrumentos de fiscalização disponíveis à sociedade civil
organizada?
A falta de renovação dos recursos humanos tem contribuído para o sucateamento e a precarização dos serviços,
além de servir como justificativa para a terceirização. A situação do Instituto de Infectologia Emilio Ribas é um
exemplo visível e, contrários à terceirização, optamos pelo fortalecimento dos serviços especializados no âmbito do
SUS em sua estrutura física, de equipamentos, de recursos humanos, de insumos e material de consumo.
Para uma resposta efetiva, é preciso que os recursos humanos sejam permanentemente capacitados e alocados nos
serviços de saúde do SUS por meio de concursos públicos. 
Consideramos as frentes parlamentares de enfrentamento ao HIV/AIDS imprescindíveis, uma vez que viabilizam a
possibilidade de intersetorialidade e do fomento de políticas públicas inclusivas. Estimuladas pela sociedade civil
organizada, as frentes parlamentares devem estar comprometidas com as discussões relativas às questões sociais,
com o humanismo, com a diversidade, com a ciência, com os direitos humanos e com a laicidade do Estado brasileiro.
Tão importante quanto a instituição de uma frente parlamentar de enfrentamento ao HIV/AIDS é sua manutenção.
Neste sentido, é fundamental a formação de frentes parlamentares nas casas legislativas em todos os municípios do
estado.
Durante o período de maior gravidade na pandemia de covid-19 vimos a inexistência de articulação, diálogo e
interlocução entre a Saúde e a Assistência Social. A epidemia de AIDS é estrutural. A construção de uma
intersetorialidade entre os sistemas únicos de saúde e de assistência social (SUS e SUAS) deve ser encabeçada pela
saúde. Assim, os ministérios da Saúde e da Cidadania devem envidar esforços para que o acordo de cooperação
técnica entre SUS e SUAS, firmado neste ano, seja efetivado. Também consideramos positiva a formação de comitês
intersecretariais que busquem políticas públicas de inclusão das pessoas vivendo com HIV ou AIDS, a exemplo da
capital paulista.
Tanto a prevenção quanto a assistência englobam as questões de vulnerabilidade.
É necessário maior investimento na formação de quadros ativistas. É urgente a que usuárias e usuários do SUS
possam protagonizar o rompimento de assédios ideológicos, de cunho moral ou religioso.
Estratégias de prevenção devem estar disponíveis a todas e a todos. Neste sentido, a educação sexual nas escolas
precisa ser assimilada e incentivada no escopo de uma política de promoção da saúde e prevenção de doenças. Por
isso, a aprovação do Projeto de Lei 1095/2017, em tramitação na Assembleia Legislativa, é fundamental para a
autonomia e autoproteção de adolescentes e jovens, compreendendo que no que tange a aspectos do
desenvolvimento humano, a informação e a educação sexual são direitos a serem preservados.
No mais recente Fórum de Dirigentes, evento que reúne gestoras e gestores da política de enfrentamento ao
HIV/AIDS dos municípios prioritários no Estado, identificamos ruídos na comunicação do Programa Estadual com os
grupos de vigilância epidemiológica e municípios. Informações importantes, como a possibilidade de aquisição de
insumos de prevenção – como preservativos e gel lubrificante – não são repassadas. É preciso que o canal de
comunicação da gestão da política de AIDS do Estado esteja afinado, inclusive para compensar a falta de aquisição
destes insumos pelo Ministério da Saúde.
Na prevenção, a descentralização da profilaxia pré-exposição (PrEP) ao HIV deve ser fomentada ainda mais, visando
que as populações de regiões mais periféricas tenham facilidade de acesso a esta já consagrada e eficaz estratégia.
A sensibilização para a prevenção deve chegar às pessoas mais vulneráveis à infecção pelo HIV. Neste sentido, a
realização de campanhas publicitárias e de testagem devem alcançar os segmentos mais vulneráveis da população,
a fim de minimizar a histórica e permanente dificuldade de abordagem do tema.
Assim, reforçamos a necessidade de aprofundamento de estratégias extra muros que possam contribuir para maior
capilaridade da PrEP, tanto nas periferias das regiões metropolitanas do estado quanto nas regiões ainda
descobertas. A prevenção deve investir na formação do adolescente, priorizar o direito à informação correta,
sensível, acolhedora, humanizada, verdadeira e, sem dúvida, incluir em suas estratégias a prevenção de
adolescentes e jovens vivendo com HIV ou com AIDS. Também consideramos necessários investimento em
estratégias mais eficazes e contundentes de prevenção dirigidas à população LGBTQIA+, bem como no investimento
de campanhas publicitárias direcionadas às populações mais vulneráveis ao HIV.
O Tratamento como Prevenção, que gerou o conceito de “indetectável igual intransmissível” (I = I) deve ser
desprovido de discursos moralistas e heteronormativos, uma vez que o conceito tem potencial de minimizar
estigma, preconceito e discriminação que sofrem as pessoas vivendo com HIV ou AIDS.
Na prevenção, sem esquecer das populações mais vulneráveis e sua intersecção com as populações prioritárias, é
preciso um olhar diferenciado para as populações privadas de liberdade, migrantes, refugiados e indígenas.
Na assistência, é necessário o fortalecimento da oferta de maiores cuidados com a saúde mental das pessoas vivendo
com HIV ou AIDS, agravadas pelo isolamento e pela diminuição da oferta de serviços provocados pela pandemia.
Um maior investimento na humanização dos serviços também deve ser considerado, uma vez que um serviço
humanizado contribui para a saúde mental de usuárias e usuários. 
Também é necessário que a autonomia da e do usuário do serviço seja respeitada e que a empatia seja estimulada.
Autonomia e empatia devem estar nas programações das capacitações continuadas de toda a equipe
multidisciplinar.
É preciso garantir que as organizações da sociedade civil sejam referenciadas pelos serviços de saúde, uma vez que
a associação entre pares contribui para o vínculo, a retenção, a adesão e para a saúde mental das pessoas vivendo
com HIV ou com AIDS.
A qualidade da assistência precisa ser ampliada. Pessoas vivendo com HIV ou com AIDS têm envelhecido e os serviços
não oferecem profissionais especializados, como geriatras, por exemplo. Também precisamos que os profissionais
de saúde cumpram os protocolos de prevenção às coinfecções ao HIV, como as hepatites e a tuberculose.
Ressaltamos o fato de que novos medicamentos não têm sido incorporados ao Protocolo Clínico de Diretrizes de
Tratamento (PCDT) ao HIV desde dezembro de 2018. Ainda, que as linhas de cuidado têm de ser efetivadas de fato,
cabendo ao programa paulista de enfrentamento do HIV/AIDS que sua implementação seja articulada com os
municípios prioritários.
Profissionais de saúde devem ser capacitados para compreender as fases de vinculação e retenção da linha de
cuidado das pessoas diagnosticadas por HIV.
Os direitos de usuárias e usuários precisam ser ressaltados, inclusive a estes, por meio de campanhas de
sensibilização. Estes direitos também devem ser amplamente divulgados a profissionais de saúde, que ainda
precisam respeitar usuárias e usuários como sujeitos de direitos.
O cancelamento de consultas foi necessário no início da pandemia de covid-19, mas tornou-se prática corrente neste
período. As consultas médicas já têm espaçamento largo e as pessoas em seguimento ambulatorial ainda têm
sentido o impacto destes cancelamentos. Assim, é necessária a retomada integral do acompanhamento clínico das
pessoas vivendo com HIV ou AIDS.
Na questão LGBTQIA+, consideramos de extrema relevância a ampliação dos ambulatórios de saúde integral da
população de travestis e mulheres e homens transexuais.
Ainda no campo da assistência, temos relatos de maior adesão com a dispensação maior de medicamentos, o que
comprovamos pelo painel de tratamento do HIV durante a covid, disponível no site do DCCIi
. Sugerimos que sejam
mantidos os 90 dias de dispensação dos medicamentos antirretrovirais a fim de garantir a continuidade da adesão
favorecida por esta estratégia.
A Declaração Universal dos Direitos Humanosii e a Declaração dos Direitos das Pessoas Vivendo com HIV ou AIDSiii
(colocar o link), construídas em 1948 e em 1989, respectivamente, devem embasar o direito inalienável de acesso à
saúde em sua integralidade, uma vez que tratam dos direitos à dignidade humana.
No campo social, o fomento aos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS) 1 e 2 – erradicação da pobreza e
combate à fome –, bem como os ODS 5 e 10 – igualdade de gênero e redução das desigualdades – devem estar
intrinsecamente relacionados ao ODS 3, que trata da saúde. A retenção, a vinculação e a adesão ao tratamento de
uma pessoa vivendo com HIV ou AIDS são melhores com as questões sociais, de igualdade e de gênero estabilizadas.
O vínculo, a retenção e a adesão são favorecidos e a eliminação da epidemia é acelerada.
Por fim, as ONG afiliadas, bem como este Fórum das ONG/Aids do Estado de São Paulo não se furtarão a exercer sua
prerrogativa constitucional de controle social das políticas públicas em HIV/aids e suas coinfecções.
São Paulo, 30 de outubro de 2021.
Fórum das ONG/Aids do Estado de São Paulo
i Painel de monitoramento de dados de HIV durante a pandemia da COVID-19. Disponível em
http://www.aids.gov.br/painelcovidHIV. Acesso em 29/outubro/2021.
ii Declaração Universal dos Direitos Humanos. Disponível em https://www.unicef.org/brazil/declaracao-universal-dosdireitos-humanos. Acesso em 29/10/2021.
iii Declaração dos Direitos Fundamentais da Pessoa Portadora do Vírus da Aids. Disponível em
http://www.aids.gov.br/pt-br/publico-geral/direitos-das-pvha. Acesso em 29/10/2021.
 

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